terça-feira, 13 de setembro de 2016

O TALHO

Encontrei o restaurante O Talho por acaso. Era segunda-feira, perto de 21 horas. Estava fazendo compras no El Corte Inglés de Lisboa. Terminada as compras, decidi voltar para o hotel caminhando. Estava na passagem subterrânea da Estação São Sebastião do metrô. Ao sair, dei de cara com o restaurante. Achei interessante o desenho no carro que estava parado em frente, de propriedade dO Talho. Sem saber nadinha do local, resolvi que ali seria meu jantar. Mudei de ideia quanto a voltar a pé para o hotel, e entrei no restaurante. Uma simpática atendente perguntou se eu tinha reserva, o que não tinha. Havia lugar. Ela pediu para esperar um pouco no próximo ambiente. Era um açougue (talho, como dizem os portugueses, daí o nome do restaurante). Cortes de carnes, hambúrgueres e produtos elaborados pelo chef Kiko Martins estavam expostos. Havia gente comprando carne. Lugar limpo, bem decorado, agradável de se ficar. Não esperei cinco minutos e já me levaram para o salão principal, cuja iluminação era mais baixa. Estava bem cheio. O atendimento é muito bom. Garçons simpáticos, que entendem todo o menu, explicam cada prato, tiram dúvidas, conversam, dão dicas. A carta é enxuta, com vinte e duas opções divididas em entradas, principais e sobremesas. Não pedi nada de álcool. Durante o jantar, bebi duas latas de 330 ml cada uma de Coca Cola Zero (€ 2,35 cada). Vi que os garçons saíam com croquetes a toda hora da cozinha, assim como um tartare. O garçom me disse que eram os carros chefes da casa. Queria comer os dois, mas gostei de outros itens do menu. Ao conversar com o garçom, ela me sugeriu fazer o menu degustação (€ 48,50), que consistia de seis pratos, sendo quatro deles imediatamente identificados para mim e dois surpresa, mas dentro do cardápio. Todos os pratos do menu degustação estão no menu, mas são servidos em quantidades menores. Junto com o pedido, o garçom anotou minhas restrições alimentares: espinafre, morango e ostras. Pedi a senha do wi-fi. Ela reflete bem a comida praticada pelo chef Kiko Martins: comer o mundo. Embora enxuto, o cardápio faz um passeio por sabores e texturas de várias partes do mundo, com um olhar muito particular do chef.
Antes de começar a degustação, ofereceram o couvert (€ 2,65). Aceitei. Cesto com três tipos de pães, todos preparados ali mesmo, pasta de grãos cozidos (predominava o grão de bico no sabor); pasta de ricota, tomate seco, anchovas e salsinha, e manteiga de gengibre, alho, salsinha e saten foram colocados na mesa. A focaccia estava fresca, macia, salgadinha e combinou bem com a manteiga, que tinha um leve sabor ardente. O pão tostado era bem crocante e foi bem com todas as pastas e a manteiga. Já o pão indiano feito com lentilhas não me agradou. Era bem fininho, quase uma lâmina crocante e quebradiça, mas tinha um forte sabor de gordura.
Em seguida, chegou o abre bocas: um aperitivo, servido em copinho de vidro. Era frio, feito com maracujá, laranja e aipo. Muito refrescante e aromático, preparou o paladar para toda a sequência que viria.
O primeiro que chegou foi o croquete de cozido português, preparado com carnes usadas para fazer o cozido português, ou seja, carnes com muita fibra e cozidas por um longo tempo, hortelã, e servido com uma maionese de chouriço (aqui entenda chouriço como linguiça). Sensacional. Crocante por fora, dourado, sequinho, e muito macio por dentro. O garçom explicou que era um mimo do chef e não integrava a sequência de seis pratos. Pena que veio apenas uma unidade. Para se comer de baciada!
Enfim, o menu degustação teve início com um ceviche, quando o chef aproveita para fazer uma ligação com seu outro restaurante, A Cevicheria. Bonita apresentação, como todos os demais pratos, aromático, o ceviche era de corvina, o peixe branco do dia, purê e chips de batata doce, cebola roxa cortada em tiras, algas e leite de tigre. Estava menos ácido do que costumo comer no Brasil. Peixe cortado em tamanhos maiores, bem marinados, muito saboroso.
O outro carro chefe de O Talho é seu tartare, que os portugueses chamam de tártaro. Foi o segundo prato da degustação a chegar. O garçom trouxe os ingredientes com linda apresentação e terminou o preparo em minha frente. A carne estava cortada na ponta de faca e apresentada em formato redondo com uma gema caipira por cima. Segurando a carne, duas folhas de alga nori. Por baixo do tartare, havia uma mousse de rábano. Ao lado, um vidrinho com um shot de vodca. O garçom quebrou a gema, misturou-a com carne, que era de novilho, e a mousse, jogando nesta mistura metade da vodca. Terminou envolvendo uma parte do preparo em uma folha de alga nori, fazendo uma espécie de sushi. No menu dizia que este prato era acompanhado por fritas, mas elas não foram servidas. Como na mesa ao lado também estavam fazendo o mesmo menu e não receberam as batatas, deduzi que vinham apenas quando o pedido era feito fora do menu degustação. O sabor do tartare era divino. Comer com ou sem a alga em nada alterou o seu sabor. Para se comer muitas vezes.
O terceiro prato a chegar foi o foie gras magrebino. Consistia de foi gras com especiarias, bolo de tâmara, kunquat e mousse de limão. Um cestinho de pão tostado acompanhou o prato. Quando li o menu, pensei que era muito sabor diferente em um mesmo prato e isto poderia prejudicá-lo. Ao experimentar, confirmei minha suspeita. Muito sabor, muita textura brigando no paladar. O tal kunquat nada mais era do que laranjinha kinkan confitada. A mousse de limão veio servida dentro de um bolinho redondo frito. Ela não tinha nenhum gosto e o bolinho tinha um sabor de gordura muito agressivo, o que aumentou ainda mais quando coloquei um pedaço do foie gras na boca. O prato se revelou enjoativo. Foi a nota dissonante do menu.
Chegou a vez do quarto prato e último que sabia previamente. Magret asiático. Com cores vivas e vibrantes, foi servido um magret de canard fatiado, em ponto perfeito, sobre um leito de bolinhas de tapioca (sagu) banhada em caldo de bacon defumado. Ainda no prato, um purê de berinjela com missô e gomos de laranja levemente adocicados. Um tempero asiático estava polvilhado no prato. A tapioca estava divina. A harmonia dos sabores foi perfeita, bem diferente do prato servido anteriormente.
O quinto prato era o último salgado. Era um borrego tandoori. Prato bem servido, com carne de borrego (carneiro de tenra idade), pão naan, chutney de frutas, mousse de iogurte natural e salada fria de lentilhas. Que prato bom! De lamber os beiços depois de terminar. O naan estava bem tostado e foi perfeito com o chutney. Sabores contrastantes que não brigaram entre si. Carne bem cozida, com ótimo tempero, sem ter aquele gosto forte de cordeiro. A salada fria de lentilhas e o iogurte deixaram o prato com o frescor necessário. Fechou a parte salgada com chave de ouro.
Por fim, a sobremesa, erva príncipe e goiaba. Outro prato com linda apresentação. A erva príncipe é de sabor cítrico e estava servida em massa de arroz crocante, que me lembrou um mandiopã no sabor e na sensação de algo estourando quando em contato com a saliva. Sorvete de goiaba leve, simples, sem água por dentro, massa consistente. Dois cremes brulée de limão bem gelados compunham o prato.
Finalizei com um café espresso Nespresso (€ 1,50), muito bem tirado.

Restaurante: O Talho
Endereço: Rua Carlos Testa, 1B, Praça de Espanha, Lisboa, Portugal.
Telefone: +351 21 315 4105 
Web: https://www.facebook.com/OTalhoChefKiko/
Data: 29/08/2016, segunda-feira, jantar
Valor total da conta: € 60,00, incluído o serviço e sem bebida alcoólica. Conta paga em dinheiro.
Minha nota: 8.

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